segunda-feira, 5 de abril de 2010

Casamento, números e costumes

O último artigo publicado sobre a Póvoa de Rio de Moinhos deu conta de um projecto que está em desenvolvimento e que utiliza preferencialmente registos paroquiais*. Com os dados apurados já se apresentaram conclusões interessantes a partir das informações coligidas pelos párocos nos actos de baptismo (Luís Duque Vieira) e de óbitos (Vitor Carvalho). Hoje apresentamos uma outra variável demográfica, o casamento – o acto jurídico pelo qual se forma um novo núcleo familiar.

O arquivo distrital guarda registos paroquiais de mais de 700 casamentos celebrados na Póvoa em cerca de 130 anos, 1773-1905. No início, entre 1773 e 1800, foram realizados 132 casamentos, sendo 102 de indivíduos solteiros, 116 de solteiras, 24 de viúvos e 21 de viúvas. Por estes dados verificamos que era elevado o número de segundos casamentos o que se explica pelo suporte material que a família então representava e a necessidade de manter um círculo familiar onde se criassem os filhos que tinham ficado órfãos.

Os meses do ano mais escolhidos para casar foram aqueles em que não havia tanto trabalho agrícola a exigir o trabalho das famílias e, assim, encontramos os meses de Inverno e a Primavera como os mais preenchidos.

Um outro aspecto a salientar é o das terras de naturalidade dos noivos. Maioritariamente casaram-se com pessoas da terra ou de pequena distância. Nestes tempos mais antigos, final do século XVIII, encontramos noivos e testemunhas originários de diversas freguesias do actual concelho de Castelo Branco, alguns de outros concelhos do actual distrito e ainda dos distritos da Guarda e de Portalegre. Significa isto que as relações sociais dos habitantes da Póvoa se estabeleciam de preferência nas regiões do interior do país já que as vias de comunicação para o litoral ofereciam maiores dificuldades.

No século XIX, nas seis primeiras décadas, não se alteram significativamente os dados referentes ao casamento: os inícios do Outono e o Verão são os menos apetecíveis para as celebrações, continua elevado o número de segundas núpcias, pouco se alarga o âmbito geográfico dos nubentes e permanece a ausência de alianças com citadinos.

Depois desta data passa a haver dados relativos à idade dos noivos. Nuns e noutros, homens e mulheres, os casamentos realizaram-se maioritariamente entre indivíduos na classe de idades dos 21 aos 25 anos. A excepção é nos anos de 1860/69 em que a idade sobe para os 26-30 anos. Também neste período de quase meio século, 6 rapazes de 20 anos, menores, tiveram autorização expressa dos pais para se casarem e celebrou-se o casamento de uma rapariga com 15 anos de idade.

Igualmente passamos a dispor da indicação das profissões dos noivos e das testemunhas. Nos primeiros predominam os jornaleiros, seguidos de perto pelos criados de servir e pelos cultivadores. Moleiros e pastores são também em grande número (25 e 29 respectivamente), sendo reduzido o número de homens dos ofícios. Do lado das noivas a referência é maioritariamente “serviço doméstico”, um número pequeno de “ocupada no serviço agrícola” (11) e costureiras (7). Do lado das testemunhas, a enorme distância, surgem os proprietários (mais de 170); moleiros (mais de cinquenta) e pastores (mais de 40) dão bem a imagem da importância social atribuída a estas profissões.

A análise dos números deixa-nos algumas interrogações que no futuro tentaremos esclarecer: qual a razão da diminuição abrupta de casamentos na década de 1860 e quais as razões de um aumento significativo de matrimónios – detectados numa pesquisa direccionada para anos de instabilidade político-militar – nos anos de 1808, 1809, 1812 e 1846.

A estes elementos numéricos juntamos algumas informações sobre os costumes que acompanhavam a festa até aos anos 70 do século XX. Mantinha-se a preferência pelo casamento no Inverno e na Primavera, não havia despedida de solteiro mas era frequente o noivo oferecer uns copos de vinho aos amigos. O noivo ia buscar a noiva a casa e acompanhava-a e aos seus convidados. Quando se queria distinguir os noivos atapetava-se a rua com verdura e as raparigas levantavam à entrada da igreja arcos enfeitados com flores e cordões de ouro. A festa rija durava todo o dia consistindo as refeições em doces caseiros e pratos de cabrito e de borrego cozinhados de diversas maneiras. Terminada a boda os noivos permaneciam na aldeia gozando agora de um novo estatuto.

Luis Duque vieira

* Quaisquer dados referentes a pessoas nascidas na Póvoa após 1905 poderão ser enviados, por mail para vmpcar[arroba]gmail[ponto]com ou lourval[arroba]hotmail[ponto]com, ou ser entregues, directamente, a Luis Duque Vieira ou Vitor Carvalho na Póvoa de Rio de Moinhos.


Fonte: http://www.reconquista.pt/noticia.asp?idEdicao=224&id=19937&idSeccao=2422&Action=noticia